A invisibilidade materna nos registros da infância
Esses dias, eu estava rolando a timeline do Instagram, no puro tédio da rotina, quando me deparei com a seguinte frase: “Pais têm fotos, mães têm selfie.”
Nossa, quanta verdade.
Abri minha galeria, fui direto no álbum do meu filho e lá estavam centenas de fotos dele. Sorrindo, dormindo, comendo banana, pulando no sofá, com a mesma roupa em 17 ângulos diferentes. Registros preciosos, espontâneos e repetitivos — como só o amor de mãe entende.
Aí, procuro por mim. Apareço em algumas selfies, quase sempre com o braço esticado, o rosto cansado, um sorriso puxado no meio do caos. E volto pra frase do início desse texto: quem registra a mãe? Silêncio absoluto.
Enquanto os pais, muitas vezes, aparecem em fotos bem enquadradas, espontâneas e cheias de significado com os filhos, as mães geralmente são as que seguram a câmera, sejam elas física ou simbolicamente. Somos as narradoras da infância, mas com frequência nos apagamos da história para que os outros possam brilhar nela.
A frase “Pais têm fotos, mães têm selfie” é mais do que um comentário: é um retrato fiel da invisibilidade materna nos registros afetivos. A selfie da mãe é o que sobra quando ninguém mais está olhando. É a tentativa de também existir, de aparecer em algum pedaço daquela memória. Porque, por mais que estejamos em tudo, muitas vezes, não estamos registradas em lugar nenhum.
Essa ausência não é só fotográfica — é estrutural. Reproduz a ideia de que o cuidado é um dom natural da mulher e, por isso, não precisa ser visto, valorizado ou reconhecido. A mãe aparece para servir, registrar, cuidar. Mas raramente como alguém que também precisa ser vista, lembrada, celebrada.
A selfie da mãe, então, vira símbolo. Do cansaço, da resistência, da sobrecarga — mas também do desejo. O desejo de estar. De ser lembrada. De aparecer com o filho no colo e o cabelo bagunçado, porque aquela também foi uma parte bonita da história.

Que a gente comece a virar essa câmera. A registrar as mães — não só nas poses, mas nos gestos, nos risos, nos olhos marejados. Que mães apareçam não apenas como pano de fundo, mas como parte essencial do retrato. Porque um dia, quando nossos filhos olharem essas fotos, queremos que eles saibam: “Ela estava ali. Inteira. Mesmo cansada, mesmo por trás das câmeras. Ela também era parte da beleza.”